Descontrucionismo teológico em ação

'Descontrucionismo teológico em ação' é um texto onde o Pe. José Eduardo que relaciona a mentalidade revolucionária e a filosofia moderna com ideologias e fórmulas que servem apenas para diluir e amordaçar a Igreja.


Descontrucionismo teológico em açãoLendo e escutando algumas reflexões nos últimos dias, quis escrever umas anotações que podem servir para assimilar melhor a natureza desses debates, especialmente porque se dão entre membros da Igreja que não se conseguem entender, justamente por usarem lógicas fechadas e incapazes de se interpenetrar. Rastrear as origens filosóficas dos discursos é fundamental para entendê-los.

I. Desde a Revolução Francesa, as forças revolucionárias pretendem tirar a Igreja da jogada mediante a sua neutralização filosófica. Então, mobilizaram-se para suprimir a Companhia de Jesus e, graças a isso, deixaram o campo livre para a expansão da filosofia moderna, que inicialmente anulava a possibilidade de conhecer o mundo objetivamente (Kant) e que depois unificava a história sacra e a história profana numa única história na qual toda a verdade é tida como provisória e dialética (Hegel).

II. Com o advento do marxismo, estes princípios teoréticos foram convertidos em técnica de uma militância que se concentrou em demolir todas as verdades (argumentos de razão) e dissolver todas as autoridades (argumentos de autoridade) através da teoria crítica, do estruturalismo, do desconstrucionismo, da arqueologia e da genealogia foucaultianas, das induções comportamentais etc.

III. Alguns teólogos, temendo o descrédito intelectual diante da hegemonia crítica, quiseram enturmar-se com esses pensamentos e adaptar a teologia a esses novos métodos. Foi Rahner quem conseguiu transpor perfeitamente o historicismo hegel-heideggeriano para a teologia e esvaziar o dogma na noção de um “deus transcendental” cujo conhecimento seria sempre incerto e se daria sempre dentro dos condicionamentos da história (já unificada, tal como no pensamento de Hegel).

IV. Na sequência, apareceram os teólogos da libertação afirmando que toda a fé é tributária dos condicionamentos sociopolíticos do seu tempo e que, portanto, precisa ser criticada enquanto legitimadora de alguma forma de poder. Ficava, assim, rompida a ideia de uma Revelação transcendente, no sentido de toda a teologia católica, e imanentizava-se-a a ponto de torná-la variável de acordo com as demandas históricas atuais (não existe uma teologia ahistórica, diziam eles).

V. Para neutralizar quem quisesse apresentar o dogma e a doutrina em geral como permanentes, os iconoclastas começaram a forjar rotulações sentimentais: imobilismo doutrinal, conservadorismo, rigidismo, tradicionalismo, fixismo etc., para inibir quem quisesse defender a coerência intrínseca da Divina Revelação com a tradição posterior, enquanto eles mesmos se ocupavam de dissolver a ideia de tradição no historicismo dialético hegeliano (a tradição não seria a transmissão coerente da mesma fé revelada, mas a atualização dessa fé segundo as solicitações do presente/futuro; o permanente nela seria justamente a sua impermanência, o fato de que ela é histórica, em sentido dinâmico-hegeliano).

VI. A relação igreja-mundo é monista, tal como a concepção de história em Hegel. Em simples palavras, a única razão que legitima a existência da Igreja é ser serva do mundo e, portanto, ela precisa parecer-se com ele (se o mundo está anarquizado, precisamos ser tão anarquizados quanto o mundo).

VII. O problema dessas ideologias é que, embora sejam lindas em suas afirmações, são simplesmente inconcretizáveis. Servem apenas como fórmula para diluir a Igreja. Dito de outro modo: os revolucionários primeiro tentaram criar um mundo anticatólico, agora querem apenas ajustar a Igreja a este anticatolicismo, para que ela mesma renuncie-se a si mesma em benefício dele.

VIII. Neste sentido, dizer que a Igreja é serva do mundo parece algo lindo, humilde, evangélico, mas, se o que a Igreja faz é justamente confirmar as pretensões do mundo, não é ela que o ensina, mas é este que a ensina. Acontece que isto é materialmente impossível: alguém já viu o mundo inteiro ensinar uma coletividade menor? Para que serviria isso? O processo pedagógico se dá justamente no sentido contrário.

IX. Do mesmo modo, dizer que a Igreja não é portadora da verdade, mas serva da verdade, pois a verdade não é um conjunto de doutrinas, mas é uma pessoa, parece ser algo lindíssimo, até que alguém tenha a “maligna” ideia de perguntar: esta sua afirmação é, em si mesma, uma pessoa ou um conjunto de ideias? Seria ela verdadeira? É verdade que Deus transcende todos os dogmas e que estes não são propriamente ele, mas a pergunta não é esta, e sim: ao revelar-se aos homens, ele não se quis adaptar ao nosso modo intelectual de conhecer de tal modo que pudéssemos adequadamente conhecê-lo justamente através das verdades sobre si que ele nos quis transmitir?

X. Ainda, é muito agradável escutar que a Igreja precisa abrir-se às novas demandas da sociedade e que é preciso dialogar com elas, pois são “sinais dos tempos”, e não podemos pregar um Evangelho para os homens do passado ou fecharmo-nos em uma pregação anacrônica. Mas, chamar o extermínio de bebês no ventre de suas mães, o extermínio de doentes em fase terminal, o suicídio assistido, a depravação sexual e a anarquização da identidade humana de “sinais dos tempos” não é apenas um recurso retórico para atirá-las numa neutralidade moral que as transforme discursivamente em condutas normais? Em seguida, a tática geralmente é apelar para o sentimentalismo e proteger tais práticas contra os “odiosos intolerantes” que pretendem salvar vidas da morte e famílias da loucura e da destruição. Se o livro do Karl Popper, “Sociedade aberta”, é a “bíblia” do George Soros e afirma que “a sociedade da tolerância não pode tolerar os intolerantes”, isso seria uma imposição totalitária ou apenas “sinais dos tempos”?

XI. Quando analisamos todos esses discursos sob o ângulo da sua possível concreção, percebemos que não passam de uma selva de non sense, neologismos que não significam coisas reais mas apenas são palavras-gatilho para sentimentos caóticos, discursos destinados a desorientar o ouvinte e desarmá-lo por completo, para que caia na perplexidade mais inexplicável e, portanto, na completa inatividade, deixando o campo aberto para os bárbaros.

XII. Às vezes, o interlocutor católico cai facilmente na armadilha de circunscrever a sua resposta à mera oposição doutrinal, apelando para a autoridade dos documentos a Igreja, invalidados de antemão por estes que se dizem apóstolos do porvir que estão lidando com situações presumidamente dramaticíssimas para as quais nem Deus teria uma resposta (a não ser deixar tudo como já está). Deste modo, os grupos católicos acabam por assumir involuntária e até imperceptivelmente a posição de sectários, dogmáticos, autoritários etc., rótulos pré-fabricados pelo oponente justamente para colocar o debate num campo confortável para ele e terrivelmente difícil para a vítima.

XIII. Do mesmo modo, não serve muito fazer uma contra-argumentação racional, pois, neste caso, o oponente não está interessado na verdade. Ele já afirma de antemão que a verdade não é uma ideia, mas uma pessoa, e que ninguém pode dizer-se possuidor da verdade etc., imunizando-se contra todo desmentido, lógico ou retórico.

XIV. O único modo de enfrentar esse caos é colocar todo o mapa das ideias em cima da mesa e mostrar qual é a ideologia que as unifica em seu caráter realmente ideológico, ou seja, esses discursos não significam nada em si mesmos, são apenas um meio para amordaçar a Igreja e fazê-la prostrar-se obedientemente diante dos seus maiores inimigos. Não se trata de uma nova doutrina, mas de um meio de desativar o catolicismo como um todo para que ele se torne inócuo, e o intento revolucionário seja alcançado sem nenhuma oposição.


Este texto foi enviado no dia 1 de julho de 2021 pelo seu autor, o Padre José Eduardo, no seu canal oficial do Telegram.

Veja também

Mais informações

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *